domingo, 15 de abril de 2007

A VIDA TEM DESTAS COISAS ...


Nesta aventura de semear sonhos, partilhar saberes e inquietações tentarei que este blog seja simultâneamente lugar de exercício de cidadania, espaço de cultura e de luta por um mundo melhor.



Sou um homem cheio de sorte.
Os melros, as carriças e as rolas escolheram nos últimos cinco anos o meu quintal para fazer ninho.
As rolas preferem um dos dois pinheiros mansos, as carriças descobriram abrigo debaixo da varanda e os melros escolheram a protecção das trepadeiras que se entrelaçam no muro.
O trinado dos pássaros substitui o despertador às 7 horas da manhã e a Primavera foi anunciada pelas carriças e melros, segurando nos bicos plantas secas e penas, para fabrico dos ninhos.
Assisti à distância com embevecida paciência a construção dos ninhos, que a pouco e pouco foram ganhando forma e mais tarde serviram de aconchego para os ovos que neles puseram.
As carriças, a ave mais pequena de Portugal, faz um ninho muito engenhoso, em forma de bola, onde deixa uma pequena abertura para entrada e saída.Talvez devido ao grande investimento que fazem na sua construção, voltam a utililizar o ninho durante o inverno para se abrigarem e tratam de o recuperar para ser de novo rentabilizado. Curiosamente o mesmo ninho serve anualmente para duas posturas de ovos e duas ninhadas, geralmente com quatro passarinhos.
Os melros fazem um ninho em local protegido da chuva pela própria vegetação e colocam quase sempre três ovos. Dos três ovos nascem três crias que vão crescendo até que a tragédia acontece...
Ao crescerem vão cobrindo as peles nuas de penas e um deles acaba por ser empurrado pelos irmãos para fora do ninho. Todos os anos é fatal a exclusão de um deles e a seguir a morte por queda ou abandono dos progenitores. Tenho assistido horrorizado a este tratamento cruel e pensei que podia evitar o fim trágico de uma das crias.
Adoptei uma atitude mais activa e comecei a reforçar diariamente a ração de minhocas que a mãe e o pai asseguram aos três filhos. Pensei que desta forma evitava a concorrência entre as crias e por via disso a expulsão de um deles do ninho.
A tragédia foi ainda maior porque acabei por encontrar um dos pequenos melros sem vida no quintal e o meu vizinho descobriu hoje mais uma vítima.
A exclusão não se deu por falta de alimento mas por falta de espaço no ninho. As crias tiveram que sair do ninho protector antes de estarem preparadas para voar e acabaram por morrer com fome ou tolhidos pelo frio e a pela chuva. Os meus gestos beneméritos resultaram numa tragédia ainda maior. Na minha consternação sou desafiado a refectir sobre a ingerência abusiva na vida do melros ...
Nem tudo é mau no meio disto porque o ouriço que se passeia de noite no quintal, acabou por ganhar duas refeições imprevistas de carne tenrinha, que o ajudarão a ganhar reservas para o período de hibernação.